Julieta de Mello Monteiro,
patrona da cadeira nº 2, nasceu em Porto Alegre a 21 de outubro de 1863. Menina, ainda, foi residir em Rio Grande na
companhia dos pais João Corrêa de Mello e Revocata Figuerôa de Mello.
Aos dezenove anos publica sua
primeira obra: Prelúdios, livro de versos prefaciado por Emílio Zaluar. Fugindo
ao romantismo vigente, Julieta de Mello Monteiro adota a linha parnasiana no
que ela tem de mais descritivo, buscando a forma perfeita e procurando
manter-se impassível diante das próprias emoções.
No prefácio de seu segundo livro
de sonetos, Oscilantes, publicado em 1892, escreve Luiz Guimarães: “São páginas
que se recomendam por si próprias. São de um desenho tão fino, de uma
vitalidade tão sincera, de uma construção tão despretenciosa e tão simples que
positivamente seduzirão o leitor, da primeira à última estrofe”.
O prefaciador compara seus
sonetos a aquarelas que poderiam ser assinadas por pintores como Henrique
Bernardell: “Assobiando uma canção dolente/ Segue a passo na estrada um
cavaleiro”/ ou a um Rembrandt: “Cai a chuva nas calçadas/ Ronca o trovão
tenebroso,/ com horrísonas rajadas/ Sopra o vento impetuoso.”
Simples, descritivos e até mesmo
ingênuos são os sonetos que compõem a primeira parte de Oscilantes, como os
versos de Antes do almoço:
“Nenê brinca com as bonecas
Junto à janela entreaberta
No pátio em cãozinho alerta
Ladra avisando as marrecas”
Ou então desta Cena doméstica:
“Do guarda-roupa, a mucama,
tira um vestido azulado,
que vai depor sobre a cama
com todo o mimo e cuidado.”
E ainda numa Cena do lar:
“A Filha em frente ao espelho
Prega uma flor nos cabelos
Enquanto escuta um conselho
Do velho pai, seus desvelos.”
São pequenos quadros que deixam
transparecer uma infância e uma juventude felizes, onde a poeta é alvo
constante de amor e cuidados. Acarinhada pela mãe, a quem dedicou verdadeira
veneração, refere-se a esta primeira fase de sua vida como “um tempo abençoado/
que me embalou docemente.”
Na figura paterna encontrou um espírito
iluminado, inteligente, digno de sua admiração e respeito. No soneto Em
Família, assim o retrata: “O pai de pé, junto à estante/ folheia um grosso
alfarrábio,/ Tendo no olhar penetrante/ A luz, os traços do sábio.”
Aos quatro irmãos consagrou grande
amizade, dedicando-lhes vários de seus sonetos. João foi descrito como jovial e
delicado, “De mediana estatura/ Claro, de leve rosado,/ Tem o cabelo ondeado/ E
a tez de viva frescura.” Octaviano Augusto era: “Alto, esguio, irrequieto/
Nervoso, sério, apressado.” Romeu, o mais cantado em seus versos, possuía
“Barba loura, mãos compridas/ Estatura de gigante/ Porte altivo, ar arrogante/
Resoluções decididas.” E Revogata, única irmã, foi retratada como sua alma
gêmea no soneto Trinta e um de dezembro:
“Somos dois corpos sim, porém uma
alma apenas.
Temos o mesmo riso e sempre as
mesmas penas,
Uma só vontade, um único desejo
Quanto almejas para mim é quanto
a ti almejo,
Se sofres, sofro eu, se ris,
também sorrio.”
Ao referir-se ao noivo e futuro
esposo, o jornalista Francisco Guilherme Pinto Monteiro, Julieta deixa
transparecer um relacionamento tranqüilo e amoroso: “Ela borda, o noivo pensa/
No futuro que os espera”. Mais adiante, já casados, descreve seu quarto em A
Alcova: “Em frente ao tocador/ De flores enfeitado/ Um leito encantador/ Com
alvo cortinado”.
Seus dias venturosos, porém, não
durariam para sempre. Um a um, Julieta foi perdendo seus entes mais queridos:
os pais, os três irmãos homens, o marido. Sua vida dourada transforma-se em
recordações do passado. Já na segunda parte de Oscilantes, apropriadamente
intitulada Dulias, encontramos estrofes melancólicas, de dor, luto,
desesperança e imensas saudades. A risonha e sonhadora poeta Julieta de Mello
Monteiro escreve agora páginas, de quem “sonhou paraísos e despertou pisando
espinhos”.
Dotada de um talento multiforme,
prossegue sua trajetória literária publicando um livro de contos Alma e
Coração; dois dramas, Coração de Mãe e O Segredo de Marcial, o primeiro em
parceria com a irmã Revocata Heloisa de Mello, e um livro de prosa, Berilos,
também escrito em parceria com a irmã.
Em seu último livro de poesias,
Terra Sáfara, publicação póstuma, há menos convencionalismo que em seus
trabalhos anteriores. Trata-se de uma coleção de versos, escritos entre
1924/28, doados ainda em vida à irmã Revocata, onde Julieta canta com elevada
inspiração amigos que já partiram, fatos históricos e o belo da natureza, como
nesta suave: Tarde de Junho:”Chove e faz frio, o inverno vem chegando,/ Traz
como sempre um manto de neblinas,/ Deus recolhe as diáfanas cortinas/ E estende
pelo céu nuvens em bando.”
O ecletismo de Julieta de Mello
Monteiro foi além. Além do verso, além da prosa, além do conto, além do drama.
Com a irmã Revocata fundou, aos 22 anos, o primeiro órgão literário da imprensa
feminina, o periódico Corymbo, que circulou por mais de meio século. O primeiro
número parece ter sido o de junho de 1885. Em formato tablóide, com quatro
páginas e periodicidade variável (foi bimensal, mensal, quinzenal e até mesmo
semanal) versava sobre assuntos literários, poesias e breves notas relativas à
vida e à obra de pessoas ligadas à arte da palavra escrita. Nele, Julieta
publicou a maior parte de sua abundante produção, colorida por discreto
panteísmo.
Mesmo após a morte de Julieta, em
27 de novembro de 1928, o Corymbo continuou a circular na cidade de Rio Grande
e em todos os estados do Brasil, extinguindo-se somente com a partida da
segunda de suas fundadoras, ocorrida em 1944.
No Editorial do número 445, de 21
de outubro de 1939, a redatora Revocata recorda comovida o natalício da irmã,
declarando: “Ela cansou em meio a romagem, depondo a pena. Não lhe faltou o
desassombro preciso, mas nem sempre a flor deixa de pender quando a rajada é
desabrida”.
Apesar do porte franzino e
delicado, Julieta de Mello Monteiro revelou-se uma mulher corajosa, idealista e
empreendedora. Seu trabalho, publicado em vários órgãos de imprensa do Estado,
tornou seu nome consagrado pelos maiores vultos: Emílio Zaluar, Luiz Guimarães,
Lobo da Costa, Damasceno Ferreira. Vivendo numa atmosfera de amor, de poesia e
de saudade, com seu estro Juliana de Mello Monteiro imortalizou seu nome e
glorificou as letras rio-grandenses.